“O que eles queriam era rendição”, diz Brandão Em meio a disputas pela indicação de conselheiro no TCE-MA, governador acusa o ministro Flávio Dino de tentar impor apoio político e pede sua suspeição no STF
Maranhão

Em um cenário já marcado por disputas políticas internas e rearranjos de forças, a relação entre o governador do Maranhão, Carlos Brandão (PSB), e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino atingiu um ponto de ruptura. O rompimento, que vinha sendo ventilado nos bastidores desde o início do ano, foi explicitado na noite de quarta-feira (13), durante um jantar reservado com aliados.
Na ocasião, Brandão afirmou que tentou manter canais de diálogo, mas que a crise se aprofundou após o que classificou como uma “imposição” para que apoiasse a pré-candidatura do vice-governador Felipe Camarão à sucessão estadual.
Segundo o governador, essa exigência nunca fez parte de qualquer entendimento político. “Nunca houve compromisso para a gente apoiar a candidatura de ninguém”, garantiu.
Pressões e ameaças
Ele relembrou que, em 2022, cedeu mais de três secretarias ao grupo ligado a Dino, mantendo inclusive os titulares das pastas de Fazenda e Administração Penitenciária, “porque estavam dando certo”. Apesar dessas concessões, afirma que enfrentou “pressões jurídicas e ameaças” durante as negociações. “Na política, a gente dialoga, a gente abre, a gente avança, mas imposição… a palavra mais certa é essa: rendição. E o que eles queriam era rendição”, afirmou.
A presidente da Assembleia Legislativa do Maranhão, deputada Iracema Vale (PSB), saiu em defesa do governador nesta quinta-feira (14), considerando a reação dele “normal, realista” diante do que avalia como parcialidade do magistrado. “São fatos conhecidos por todo o povo maranhense”, afirmou, ressaltando a necessidade de se garantir imparcialidade.
Conselheiro aposentado nega “venda” de vagas
No mesmo contexto das disputas judiciais e políticas que cercam a escolha de conselheiros para o Tribunal de Contas do Estado do Maranhão (TCE-MA), o conselheiro aposentado Álvaro César de França Ferreira divulgou, nesta quinta-feira (14), uma nota pública para negar qualquer envolvimento em suposta “venda” de vaga na Corte de Contas.
A manifestação ocorre após o ministro Flávio Dino encaminhar à Polícia Federal denúncia feita pela advogada Clara Alcântara, de Minas Gerais, e depois de o governador Carlos Brandão solicitar ao Ministério Público que também apure o caso.
No comunicado, Álvaro César — último a se aposentar do cargo — afirma de forma categórica que “qualquer insinuação a esse respeito não corresponde à verdade” e que sua saída foi motivada exclusivamente por questões de saúde, devidamente comprovadas. Ele garante que o ato seguiu todos os trâmites legais, de forma “transparente e legítima”, sem qualquer relação com vantagens indevidas, acordos escusos ou condutas incompatíveis com a função pública.
O conselheiro aposentado relembra seus 36 anos de atuação ininterrupta no TCE-MA, ressaltando que sempre pautou sua conduta pela ética, transparência e compromisso com o interesse público. “Não é condizente com a minha história profissional nem com meus princípios compactuar com qualquer conduta que macule a honra do cargo ou a credibilidade da instituição”, declarou.
Ele acrescenta que “causa indignação” ver seu nome citado em “narrativas inverídicas” e sendo alvo de investigação sobre ato administrativo que classifica como “permeado pela legalidade”. Finaliza reafirmando confiança de que “a verdade se sobreporá a qualquer mentira ou calúnia” e que manterá seu compromisso com a sociedade maranhense.
Entenda o caso
O conflito institucional se intensificou após Dino, como relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.780, suspender o processo de escolha de um conselheiro do TCE-MA em vaga de livre indicação do governador e determinar o envio de documentos à Polícia Federal para abertura de inquérito no prazo de 60 dias. As acusações partiram da advogada Clara Alcântara Botelho Machado. Dino rejeitou a entrada dela como amicus curiae no processo, mas autorizou a investigação.
O governo maranhense acusa a advogada de litigância de má-fé e pede que ela seja sancionada. Alega ainda que a decisão extrapola os limites do controle concentrado de constitucionalidade e fere o devido processo legal, pois governadores, segundo a Constituição, só podem ser investigados criminalmente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), e não pelo STF.
Na peça apresentada ao Supremo, Brandão sustenta que as regras contestadas já foram alteradas pela Assembleia Legislativa, o que acarretaria perda de objeto da ação. Além disso, afirma que o ministro não é imparcial para julgar o caso, citando como exemplo a nomeação de Marcelo Tavares para o TCE-MA em 2021, quando Dino ainda era governador, com base nas mesmas regras agora questionadas.
“O Ministro Relator, enquanto Governador do Estado do Maranhão, nomeou o Conselheiro Marcelo Tavares […] exatamente do conjunto normativo que é impugnado nesta ação”, diz o documento. Para Brandão, a omissão desse fato nos autos “visa blindar e afastar a apreciação da nomeação” e constitui “grave deslealdade” e “profundo risco à neutralidade e imparcialidade do julgamento”.
O recurso também destaca que o Solidariedade, partido autor da ação, desistiu do processo após as mudanças legislativas, e critica tentativas de novas intervenções de legendas aliadas a Dino.
O governador cobra que o plenário do STF analise não apenas a decisão monocrática, mas também o próprio agravo. Ele ainda questiona: “Por qual motivo não houve a determinação e cumprimento do regimento na presente ADI para referendo da liminar [pelo plenário], se na ADI 7603 (que trata do mesmo objeto e do mesmo regimento interno) houve referida determinação?”.
Análise da notícia
Este fato político revela um embate entre o governador Carlos Brandão e o ministro do STF Flávio Dino em torno da indicação de um conselheiro para o TCE-MA. Brandão questiona a imparcialidade do ministro e pede seu afastamento do processo, enquanto o conselheiro aposentado Álvaro César nega envolvimento em suposta negociação de vaga e afirma que sua aposentadoria foi legal e motivada por saúde. A situação mistura disputas políticas, divergências jurídicas e pressões institucionais em um momento de acirramento no cenário político maranhense.
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